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Mostrando postagens de 2004

_plínio e a mulher do corredor [conto]

I Já passava das 20:00 quando Plínio resolveu que queria uma cerveja. Fazia uma noite de verão, mas era primavera. O calor noturno parecia grudento, e uma cerveja com boa conversa viria bem a calhar: o gelado amargo faria nada mais que realçar o calor pré-verão. Chaves na mão, pegou a carteira e deixou um recado na geladeira: "volto já". Entrou no carro apressado e se perguntando se deveria ir de carro, "é tão perto". Foi. Passou no Boteco do Jorvêncio, na esquina de trás, e viu nada mais que as pessoas de sempre. Seus ânimos pediam mais. Mais agito, mais burburinho, mais música. A familiaridade do boteco estava longe destas sensações. Parou no posto para abastecer. Entrou na loja de conveniências e pegou uma cerveja já com dúvidas sobre seu destino. Pegou, pagou, saiu. De novo no carro, ele resolve passar na vila, já sabia com quem tomar uma cerveja. II Plínio era um cara legal. Ou pelo menos, era o que se dizia. Bonito – bem apessoado --, simpático, tinha s

_meu filho é maconheiro (conto)

- Mariuza, estou absurdada! -Ah, Paulinha, eu tenho certeza, ele fuma maconha. Desgraçado, eu sei que ele anda fumando por aí! - Mari, chega. O que é isso? Você com tanta desconfiança de seu próprio filho? E olha: se eu conheço bem ele, menino tão bom, tão gentil e educado, trabalhador, nunca te deu dor de cabeça… ele nunca ia fazer uma coisa dessas. Eu tô com a Paula: é um absurdo você pensar isso do Juninho. E vê se pára de chorar e se acalma. - Claudinha? Você também? Eu não acredito. Criei o menino com tanto amor, com tanta dedicação, dei minha vida para ele, e o que ele faz? Vai fumar maconha, o vagabundo! - Eu é que não acredito! Você fala como se o menino fosse um bandido, um marginal. Como pode você falar uma coisa dessas. É só olhar pra cara dele… nunca fumou nem vai fumar isso. Pára com essa desconfiança besta, Mari, teu filho é um ótimo rapaz, saudável, inteligente, tem a namoradinha dele, foi tão bem criado. Eu acho que você está preocupada à tôa. - Vocês, tias, não

_after horizon [pic]

_pic one ***

_cerrado [poema]

me perdi no cerrado e vi uma solidão estranha nada além do canto da ema do rouco tropeço de meu cavalo apenas eu e os pastos iluminados pelo silêncio do sol alto apenas o silêncio e a vida seca dos seres cerrado me perdi e senti que tinha perdido um amigo bom senti que havia ausência de mim na minha presença na solidão infinita ínfimo e etéreo me percebi perdido tão pequeno um grão de cavalo entre vacas distocidas o calor soporífero distorcendo a curva do horizonte amarelecido me perdi no cerrado e vi a solidão da vida em paz descansei a vista cansada de barulhos sonsos e o que vi me trouxe paz de eremita ermitão não solidão

_no onibus, na cidade [conto]

“Hum, assim, com força. Me pega de jeito... ah, que gostoso.” Annanda é uma bela mulher. Ou, ao menos, é o que diriam grande parte dos homens que a conhecem. “Vai, vai... não pára, não pára... hum, se o Caetano fosse assim!”. Mas uma idiota, diriam outros, pois ela não trai o marido de jeito nenhum. E fala mal dele o tempo todo... vai entender! “Ai, adoro isso... que loucura! Hum, vai, vai.” Muitos, principalmente os colegas de trabalho, já o apelidaram de “o frouxo da Anna”, veja só, de tanto que ela fala mal dele. Alguns justos – são poucos – sabem que não é bem assim (os que têm mais de sessenta anos e sabem que nada vão conseguir com ela). “Vai, me bate na bunda, vai, vai, ah, vai, mais forte, mais... se o Caetano fosse assim”. Mas, com todos os poréns e frustrações, é uma mulher fiel e nunca trairá Caetano. “Ah, não... logo agora! Que merda. Ah, não... 06:30... aaaah!”. O despertador tocou. Annanda se levanta, mesmo com toda a raiva que sente. Nem olha para o namorado, que não se

_o corpo [poema]

o corpo oco pede um sopro cabe apenas no vazio de tuas mãos corpo de lama louco de cama o molhado liso de tua pele olho pouco vejo solto um corpo um ginógrafo perdido em sua visão discorro lento um espirro um esporro deixou pequena sua alma leve sussurro não caibo não sinto finjo cama, cama, cama, cama chão setembro de 2003 ***

_thiago ribeiro [conto]

Thiago Ribeiro era uma figura notável. Não por ser inteligentíssimo, ao que normalmente se aplica tal adjetivo, ou por ser realmente aquele tipo de gente que é impossível caminhar na rua sem ser olhado com interesse e curiosidade pelas pessoas; mas pelas coisas - quase prodigiosas - que dizia. Quer um exemplo, atento leitor? Certa vez, em um comício – sim, ele era metido com política – dissera, com todo o alto e bom som que os parcos alto-falantes possibilitaram: “Se eleito, vou trazer o mar para a cidade de S...”. Ah... a cidade de cidade de S...! Acidade de S... situa-se - acredito eu -, ainda hoje, a pelo menos 120 quilômetros do mar, no alto da serra. E é claro que esta frase de impacto, bota impacto nisso, não acionou ovação alguma, mas sim os mais variados tipos de vaia. Risos da inocência do político – não por achar ele que realmente era possível levar o mar até a tal falada cidade, mas por imaginar que o povo acreditaria em tal cascata – e, aos mais engajados, sorte dele que su

_água [poema]

cai muda na muda de rosa desnuda cai leve limpando a imunda favela inunda alegria celeste nos olhos nordeste na boca seca seca a sede deságua agreste na seca raimunda nordeste a sede mata raimunda de sede inunda setembro de 03 ***

_poema aliterando P e B [poema]

busquei soprar belos beijos perdidos até a boca beijei peguei breve a sombra do corpo bruxuleante nos pés pequenos pequei pelos lábios de pêlos púberes brilhantes preciso, brinquei nas pernas boêmias de pluma e bronze pediu-me “bebei” no plural do peito pomposo, abissal pluralmente abismei de berros pétreos, plúmbeos, balbuciantes retumbei outubro de 2003 ***

_diálogo sobre realidade [msn]

deds: brasília de novo!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! diz: digamos q nada de mais mauricio_babilonia: rs mauricio_babilonia: certo. mauricio_babilonia: minha avó dizia que a beleza e a inutilidade das coisas mora no tempo. deds: brasília de novo!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! diz: concordo mauricio_babilonia: ela estava, 90% do tempo, certa. mauricio_babilonia: vc entrou no meu blog? deds: brasília de novo!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! diz: o problema é q as pessoas estão sempre dentro do tempo. acho q só quem está fora do tempo é capaz de percebner isso. ainda não entrei. mauricio_babilonia: minha avó estava fora da realidade quando me disse isso, cara. deds: brasília de novo!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! diz: só podia mauricio_babilonia: tempo e realidade são mesma coisa? deds: brasília de novo!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! diz: acho q não deds: brasília de novo!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!! diz: acho q realidade é o ponto de vista de um indivíduo mauricio_babilonia: ambas as coisas são imp

_sell your mind [img]

sell your mind ***

_caseiro [conto]

Existe um certo tipo de gente que não dá. Quando eu digo “não dá”, pretendo que subentenda-se que não dá para conversar, não dá para ficar perto, não dá para ser amigo, não dá para ouvir, não dá para sair junto, não dá para tra-balhar junto, não dá para nada, nem para falar bem. Aquele tipo que é mal humorado, chato, cheio de manias, vive “causando”, como dizem alguns. Se está bom para ele, também estará para poucos outros iguais a ele. Se dizem incompreendidos, pertencentes a um outro universo de pensamentos, menos niilista, mais “elevado”, mais cheio de idéias e atos do que este a que pertence a maioria dos mortais. Mas, querendo ou não, são uns tipinhos bem chatos.André Japiassu Tavares da Silva era assim: chato como poucos. Um mal humor tremendo, reclamão, cheio de dedos, observações e papas-na-língua. Descon-fiadíssimo. Alto e bonito, era meio moderninho, mas sem querer ser. Costuma-va ir aos lugares para acompanhar a noiva, mulher pela qual era apaixonado. Mas ele estranhava tudo